As medidas de compensação do projeto de lei (PL) que amplia a isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) até quem ganha R$ 5 mil por mês — na mira da Câmara, onde parte dos parlamentares já se articula para desidratá-las — se baseiam no aumento da cobrança de quem ganha mais, mas quem mais sentirá no bolso a conta é o grupo de 0,1% dos brasileiros (pouco mais de 200 mil pessoas) de maior renda.
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Para boa parte das pessoas, inclusive aquelas que podem ser considerados de classe média alta ou alta, pouco mudará, como mostra a análise das mudanças para cinco grupos diferentes de contribuintes, descritas a seguir pelo GLOBO.
Segundo estimativas do economista Guilherme Klein Martins, professor da Universidade de Leeds, no Reino Unido, e pesquisador do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made), da USP, as alíquotas efetivas (a taxa percentual do quanto do rendimento total é pago de IRPF) de quem está no grupo dos 5% de maior renda, mas fora do topo do 1%, já está muito perto de 10%.
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A taxa mínima de 10% de IRPF para quem ganha acima de R$ 50 mil por mês, ou R$ 600 mil por ano, é a principal medida de compensação proposta pelo Ministério da Fazenda no PL. Para quem já paga 10% ou mais, nada mudará.
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No seleto grupo do 0,1% mais rico, formado por pouco mais de 100 mil brasileiros, o rendimento médio mensal é de R$ 392 mil, segundo cálculos dos pesquisadores do Made, com dados da Receita Federal. E pagam em média 7,4% de IRPF. No grupo de 0,01%, essa média cai para 3%, estima Klein.
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— É muito absurda a alíquota efetiva dos super-ricos no Brasil. É muito baixa — disse o pesquisador, ressaltando que além de criar um rombo fiscal, a desidratação das medidas de compensação aumentaria a desigualdade de renda. — Olhando friamente para os números, aumentaria a desigualdade.
Trabalhador com carteira e salário de até R$ 5 mil ao mês
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Os trabalhadores com carteira assinada e salário de até R$ 5 mil ao mês ficarão isentos do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), conforme o PL proposto pelo governo. Hoje, está isento quem ganha até R$ 3,036 mil ao mês (o equivalente a dois salários mínimos). Quem ganha de R$ 3,036 mil a R$ 3,533 mil ao mês paga alíquota de 7,5% (com dedução de R$ 182,16, para garantir que quem ganha R$ 3,037 mil siga isento).
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Esse percentual vai subindo conforme as faixas de rendimento até alcançar 27,5%, acima de R$ 5.830,85 mil (com dedução de R$ 908,73). A alíquota efetiva (a taxa percentual do quanto do rendimento total é pago de IRPF) é menor, porque considera as deduções (que reduzem o valor total sobre o qual a alíquota nominal incidirá) e eventuais rendimentos isentos ou com tributação específica.
Trabalhadores com carteira com salário de R$ 5 mil a R$ 7,35 mil ao mês
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Na proposta em discussão na Câmara, haverá uma tabela específica para quem ganha de R$ 5 mil a R$ 7,35 mil ao mês. As alíquotas serão progressivas, subindo aos poucos conforme a renda aumenta, e haverá uma dedução automática, para evitar que quem ganha pouco acima de R$ 5 mil ao mês pague IRPF e, portanto, acabe com um salário líquido abaixo do limite da isenção.
Com isso, quem ganha entre R$ 5 mil e R$ 7,35 mil ao mês pagará menos IRPF do que hoje.
Profissionais liberais com carteira e salário acima de R$ 50 mil ao mês
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Dentistas, arquitetos, advogados e outros profissionais liberais com carteira assinada e salário superior a R$ 50 mil ao mês seguirão com a atual alíquota de 27,5% de IRPF descontada em folha. Apenas estará sujeito à cobrança do IRPF mínimo quem ganha acima de R$ 50 mil ao mês e tem alíquota efetiva abaixo da nova tabela da alíquota mínima.
Para quem ganha de R$ 50 mil a R$ 100 mil por mês (de R$ 600 mil a R$ 1,2 milhão por ano), a alíquota mínima subirá aos poucos até chegar a 10%, na faixa superior. Os brasileiros que pagam a maior alíquota efetiva são os que têm renda média de R$ 29,685 mil ao mês, com quase 12% de IRPF — ou seja, para eles, nada mudará.
A partir dessa faixa de renda, a taxa efetiva vai caindo, segundo os cálculos de Klein. O grupo que está no 0,1% de maior renda do país ganha em média R$ 392,582 mil por mês e paga alíquota efetiva de 7,4%. Esses brasileiros passarão a pagar o mínimo de 10%, com aumento de tributação.
Profissionais liberais com rendimento superior a R$ 50 mil ao mês e que trabalham como pessoa jurídica
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Tomemos como exemplo um profissional liberal que atua por meio de uma empresa, prestando serviços — é o caso de um médico que tenha seu consultório, um engenheiro que tenha uma consultoria ou um arquiteto com seu escritório —, e tenha rendimento mensal de R$ 55 mil.
A empresa recolhe Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) por alíquotas que variam conforme a faixa de faturamento e seguirá dessa forma.
Para as empresas do Simples, nada muda. A remuneração desse profissional, sócio-proprietário da empresa, é paga por meio de dividendos, ou seja, a distribuição dos lucros da firma. Hoje, esse tipo de rendimento é isento de IRPF. Para saber se pagará IRPF mínimo, o profissional deverá calcular sua alíquota efetiva, incluindo no cálculo todos os seus rendimentos, até os dividendos.
Na hipótese de toda a renda do profissional vir de dividendos, ele hoje paga zero de IRPF; na nova regra, pagará a alíquota mínima conforme a nova tabela — para renda anual de R$ 660 mil, abaixo de 2,5%. Quem receber mais de R$ 50 mil ao mês em dividendos pagará IRPF na fonte, de 10%, que poderá ser eventualmente restituído, após a declaração anual de ajuste, caso a alíquota efetiva fique acima da que deveria conforme a nova tabela.
Profissionais que têm rendimento maior que R$ 50 mil combinando salário de carteira assinada e empresa
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Nesse caso, também vale a soma de todos os rendimentos, calculando a alíquota efetiva. O total, considerando o rendimento recebido de carteira assinada — sobre o qual continuará incidindo a alíquota de 27,5% recolhida em folha — e demais rendimentos, será tributado pela nova regra se exceder os R$ 600 mil anuais.
Se, ao fazer a declaração de ajuste, a alíquota efetiva, que considerará o IRPF retido na fonte, ficar acima de 10%, nada mudará para esse profissional.