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Patrimônio cultural entra em pauta na luta contra a crise climática — Ministério da Cultura



A crise climática e seus impactos sobre o patrimônio cultural estiveram no centro do debate do evento paralelo Ação Climática e Patrimônio Cultural em Tempos de Crise: Desafios Comuns, Objetivos Globais, realizado nesta terça-feira (30), no Mondiacult 2025, em Barcelona. A atividade, organizada pelo Ministério da Cultura da Espanha e moderada por Antonio Antequera Delgado, reuniu representantes de governos e organizações internacionais para discutir ações coordenadas em escala global.
O Brasil esteve representado pelo presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Leandro Grass, que apresentou iniciativas brasileiras voltadas à preservação do patrimônio cultural frente aos efeitos das mudanças climáticas, com destaque para o reconhecimento das comunidades quilombolas como patrimônio cultural, priorizando grupos historicamente vulnerabilizados.
“Desde 2023 decidimos reconhecer os quilombolas como patrimônio cultural. Não é o Estado, são eles mesmos que definem o que deve ser preservado. É importante garantir que as próximas gerações tenham consciência sobre a importância do patrimônio e dos saberes tradicionais na sustentabilidade frente às mudanças climáticas”, discursou.
A diretora executiva de Cultura da UNESCO, Dorine Dubois, destacou a cultura como elemento central na mitigação e adaptação climática, ressaltando o papel da instituição em produzir normas, relatórios e apoiar países vulneráveis por meio de seus 60 escritórios de campo.
Entre as ações em andamento está a proteção de florestas reconhecidas como Patrimônio Mundial, que absorvem cerca de 190 milhões de toneladas de CO₂ por ano — o equivalente a metade das emissões fósseis anuais globais. “A cultura está profundamente impactada pelo campo climático. Devemos reconhecer o papel que desempenha na ação climática”, afirmou.
Grupo de Amigos
O Grupo de Amigos, criado durante a COP28 em Dubai, já reúne 56 países e parceiros (ONU, União Europeia, União Africana) e atua para articular políticas climáticas no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC).
“O intercâmbio de conhecimentos foi construído ao longo de muitos anos de trabalho, sobre a base do conhecimento, do intercâmbio de ideias e dos nossos parceiros”, destacou Mahnaz Anwar Fancy, representante do grupo.
A Espanha ainda apresentou o “Livro Verde de Gestão Sustentável do Patrimônio Cultural”, um guia com ferramentas para sustentabilidade econômica, social e ambiental, além de programas de capacitação para agentes públicos. A política nacional de adaptação espanhola também integra saberes tradicionais e apoio a energias renováveis em sítios patrimoniais.
Os painelistas ressaltaram a importância do conhecimento tradicional de povos indígenas, quilombolas e comunidades locais na gestão de recursos, na construção sustentável e na resiliência comunitária. A integração desses saberes em planos de risco e políticas científicas foi apontada como essencial para respostas mais eficazes às crises climáticas.
Organizações como ICOMOS e IPCC colaboram com a UNESCO para criar indicadores que reflitam a contribuição desses conhecimentos para mitigação e adaptação — com ênfase em reconhecer direitos territoriais e soberania das comunidades tradicionais.
“Recuperar as tradições e saberes locais é essencial: fomos deixando de lado, catalogando como patrimônio imaterial, mas agora precisamos trazê-los de volta e aplicá-los”, salientou Ángeles Albert de León, diretora-geral de Patrimônio Cultural e Belas Artes do Ministério da Cultura da Espanha.
Os debates também destacaram a urgência de ferramentas de gestão mais flexíveis, adaptáveis a contextos regionais, e de financiamento direto para comunidades e organizações de base.
Erminia Sciacchitano, co-presidenta do Grupo de Especialistas da União Europeia para a descarbonização dos setores culturais e criativos, questionou como transformar boas práticas locais em políticas públicas estruturadas. “Como podemos transformar boas práticas em políticas públicas de fato? Como medir e acelerar o progresso dessa mudança de forma eficiente?”, provocou.
Foram compartilhados exemplos como o uso de energia solar no Teatro Real de Madrid, projetos de crédito climático na Irlanda, fundos de “cultura verde” na Alemanha e a campanha HeritageAdapt3000, que busca integrar conhecimento tradicional à avaliação de riscos até 2030.
Entre as sugestões finais, destacaram-se: criação de fundos climáticos específicos para cultura e comunidades locais; formalização da participação de comunidades indígenas e tradicionais na formulação de políticas; e o fortalecimento de indicadores culturais nos planos nacionais de adaptação.



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