O segundo dia do 2º Seminário Internacional Cultura e Mudança do Clima, realizado neste sábado (1) no Palácio Gustavo Capanema, no Rio de Janeiro, e promovido pelo Ministério da Cultura (MinC), reuniu especialistas, ativistas e gestores culturais de diversas partes do mundo para debater como a cultura pode ser uma força motriz na busca por soluções e novas perspectivas diante da crise climática. Os painéis abordaram desde a importância da imaginação coletiva e dos saberes tradicionais até os desafios do financiamento e o poder das narrativas na construção de um futuro mais sustentável.
A mesa de abertura, intitulada Um Tempo de Monstros: Cultura, Arte e Imaginação Coletiva Diante da Crise Planetária, mediado pela presidente da Fundação Nacional de Artes (Funarte), Maria Marighella, focou no papel da cultura como ferramenta para lidar com as complexidades do colapso ambiental em curso. O cientista brasileiro Carlos Nobre, referência mundial em estudos sobre mudanças climáticas, destacou a urgência de proteger os biomas brasileiros, especialmente a Amazônia. “A interação sinergística entre a mudança do uso da terra, os grandes desmatamentos que os nossos biomas vêm sofrendo há séculos, e o aquecimento global está induzindo a fenômenos extremos, como secas e ondas de calor”, alertou. Nobre também ressaltou o papel fundamental dos povos indígenas na preservação ambiental e defendeu a combinação de conhecimentos científicos e saberes tradicionais para gerar inovações em uma sociobioeconomia baseada na biodiversidade.
Tulio Andrade, diretor de Estratégia e Alinhamento da COP30, reforçou a importância da cultura para a resiliência das comunidades e para a transformação de mentalidades. “A gente vê a cultura como esse potencial, com pontos de inflexão que possam permitir transformações positivas”, afirmou. A educadora e pesquisadora Vanessa Andreotti, da Universidade de Vitória, no Canadá, propôs uma reflexão sobre a crise climática como uma “metaconsequência” de ações humanas ao longo da história, enquanto o sul-africano Kumi Naidoo, presidente do Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis, enfatizou o poder da arte e da cultura para “nos ajudar a imaginar futuros”.
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A quarta sessão do seminário, Financiando um setor cultural sustentável e resiliente, abordou os desafios e as oportunidades de investimento para que a cultura se torne parte ativa da solução climática. Cláudia Leitão, secretária de Economia Criativa do MinC, defendeu “além de imaginar um outro planeta pela cultura, nós precisamos pensar em uma nova economia” que valorize a biodiversidade cultural e integre as indústrias criativas a conceitos como economia solidária e circular. Para a secretária, é fundamental que a discussão sobre financiamento incorpore os valores da cultura no que diz respeito às questões ambientais e climáticas.
Marcus Tebogo Desando, diretor do Fundo Prince Claus, reforçou a visão da cultura como uma “necessidade básica” e um motor de resiliência, destacando a importância de um ambiente mais equitativo para os países do sul global. Mariana Resegue, diretora executiva do C de Cultura, apresentou dados da pesquisa “Cultura e Clima”. Ela destacou a importância de direcionar esses recursos para fortalecer os saberes tradicionais e promover transformações nos territórios. “A valorização dos saberes tradicionais já é um consenso, mas é preciso que o financiamento acompanhe essa visão, garantindo que os recursos cheguem aos territórios e promovam a transformação que almejamos”, ponderou.
Ana Carolina Lourenço, diretora programática do Instituto Cultura, Comunicação e Resiliência (ICCI), ressaltou a importância da dimensão territorial nas políticas culturais, uma proposta da ministra Margareth Menezes. Ana explicou as diferentes frentes de financiamento climático — mitigação, adaptação e perdas e danos — e argumentou que a cultura tem um papel central a desempenhar, especialmente na reparação de perdas simbólicas, como a de um terreiro centenário destruído por um evento climático extremo. Ela também expressou otimismo com a possibilidade de o Brasil realizar a “mais cultural das COPs”, aproveitando a riqueza de suas manifestações culturais para engajar a sociedade no debate climático.
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Novas formas de contar o mundo
O último painel do dia, Novas formas de contar o mundo: o papel do storytelling na mudança do clima, mediado pelo secretário de Formação, Livro e Leitura do MinC, Fabiano Piúba, explorou o poder das narrativas para engajar a sociedade. “Mais do que uma técnica de comunicação, que é vital, necessária e importante, é necessário engajar e capturar a atenção e a emoção dos ouvintes e dos leitores e dos espectadores, as histórias e narrativas são recursos para dar sentido ao mundo e às nossas vidas. As histórias e as comunidades narrativas são meios de engajamento e atos para a transformação do mundo” avalia Piúba.
Gabriel Gomes, diretor-executivo da Purpose Brasil, defendeu a criação de estratégias de comunicação localizadas, que partam de vozes que entendem o contexto local. “É muito importante criar estratégias que sejam localizadas, que partam de vozes de pessoas que de fato entendem aquele contexto. Nesse sentido, nasce toda uma força potencial de comunicação a partir dos criadores de conteúdo, dos protagonistas locais, que recebem, de alguma maneira, a possibilidade de traduzir esses conteúdos para a realidade que de fato elas vivem””
Dríade Aguiar, cofundadora da Mídia NINJA, ressaltou a oportunidade de o Brasil assumir a liderança na narrativa ambiental global durante a COP. George Marshall, especialista em comunicação climática, e Marianna Olinger, produtora do documentário “O Território”, também compartilharam suas experiências sobre a importância de contar histórias que conectem e mobilizem diferentes públicos.
O segundo dia do seminário evidenciou um consenso sobre a urgência de repensar o financiamento da cultura e o poder das narrativas como estratégias essenciais para o enfrentamento da crise climática. A mensagem que ecoou ao longo do dia foi a de que a cultura, com sua capacidade de gerar sentido, beleza e encantamento, é uma ferramenta poderosa para mobilizar a sociedade e construir um futuro mais justo e sustentável para todos.
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