Início NACIONAL Planalto adota estratégia para esfriar crise após Alcolumbre subir o tom contra...

Planalto adota estratégia para esfriar crise após Alcolumbre subir o tom contra ‘interferência indevida’ na sabatina de Messias


Em uma escalada na crise com o Palácio do Planalto, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), subiu o tom contra o governo de Luiz Inácio Lula da Silva e acusou “setores do Executivo” de tentar associar dificuldades de apoio no Congresso à negociação de cargos. Em uma dura nota divulgada ontem, o senador apontou interferência indevida no processo envolvendo a análise da indicação do advogado-geral da União (AGU), Jorge Messias, ao Supremo Tribunal Federal (STF), e afirmou considerar as insinuações ofensivas “não apenas ao Presidente do Congresso Nacional, mas a todo o Poder Legislativo”.

A reação do Planalto foi de tentar pôr panos quentes na crise. Pouco após Alcolumbre divulgar a nota, a ministra Gleisi Hoffmann, da Secretaria de Relações Institucionais, foi às redes sociais dizer que o governo tem pelo presidente do Senado “o mais alto respeito e reconhecimento”. A estratégia, segundo aliados da ministra, é fazer acenos à cúpula das casas legislativas para distensionar a relação.

A indicação de Messias ao STF aprofundou o mal-estar entre o Palácio do Planalto e o presidente do Senado. Segundo aliados, Alcolumbre não foi comunicado da escolha por Lula antes do anúncio e já havia demonstrado incômodo com a forma como o processo vinha sendo conduzido. O preferido dele, e também da maioria dos senadores, era o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

“É nítida a tentativa de setores do Executivo de criar a falsa impressão, perante a sociedade, de que divergências entre os Poderes são resolvidas por ajuste de interesse fisiológico, com cargos e emendas. Isso é ofensivo não apenas ao Presidente do Congresso Nacional, mas a todo o Poder Legislativo”, diz o senador.

No Planalto, auxiliares de Lula admitem que, neste momento, o advogado-geral da União poderia sofrer uma derrota no plenário do Senado, onde precisa de 41 votos para ter seu nome aprovado. Alcolumbre traçou um calendário que prevê a sabatina para 10 de dezembro, quando também pretende levar a indicação à análise dos senadores. O cronograma apertado, porém, foi visto como uma “armadilha” por integrantes do governo, pois não haveria tempo hábil para Messias conquistar os apoios que faltam.

Entre governistas, o discurso é que Alcolumbre segue a lógica de vender dificuldades na aprovação de Messias para poder ter margem em negociações de seu interesse. Segundo o colunista do GLOBO Lauro Jardim, uma das possíveis pedidas do senador para facilitar a vida de Messias no Senado é a presidência do Banco do Brasil — cadeira há muito tempo ambicionada por ele.

Aliados do senador, contudo, negam que haja negociações por cargo e que a indicação de Messias segue o rito normal. No comunicado divulgado ontem, Alcolumbre aponta tentativa de desmoralizá-lo. “Nenhum Poder deve se julgar acima do outro, e ninguém detém o monopólio da razão. Tampouco se pode permitir a tentativa de desmoralizar o outro para fins de autopromoção, sobretudo com fundamentos que não correspondem à realidade”, diz a nota do presidente do Congresso.

Ele ainda afirma ver tentativa de “interferência indevida” com o fato de Lula ainda não ter enviado ao Congresso a mensagem ao Senado com a indicação de Messias. Como mostrou o GLOBO, aliados de Lula afirmam que a falta de comunicação é estratégica: sem a notificação em mãos, o Senado teria que adiar a sabatina e a análise do nome, marcada para 10 de dezembro.

Para o Planalto, o adiamento pode ser uma saída diante das resistências a Messias entre senadores. A ideia seria conseguir mais tempo para negociar votos a favor do AGU, sem riscos de uma derrota no plenário do Senado, onde ele precisa do apoio de ao menos 41 parlamentares.

“Causa perplexidade ao Senado que a mensagem escrita ainda não tenha sido enviada, o que parece buscar interferir indevidamente no cronograma estabelecido pela Casa, prerrogativa exclusiva do Senado Federal”, diz Alcolumbre, acrescentando que assim como é prerrogativa do presidente da República indicar ministro ao STF, “também o é a prerrogativa do Senado de escolher, aprovando ou rejeitando o nome”.

Veja como aconteceu a escalada da crise entre o governo e o presidente do Seando, Davi Alcolumbre, sobre a escolha do indicado para o STF — Foto: Editoria de Arte
Veja como aconteceu a escalada da crise entre o governo e o presidente do Seando, Davi Alcolumbre, sobre a escolha do indicado para o STF — Foto: Editoria de Arte

A avaliação entre aliados de Lula é que é necessário mapear as insatisfações de Alcolumbre e seu entorno político, entre os quais os senadores Eduardo Braga (MDB-AM), Otto Alencar (PSD-BA), Omar Aziz (PSD-AM) e Renan Calheiros (MDB-AL), para melhorar o ambiente político.

Ainda que o assunto não esteja à mesa neste momento, não se descarta abrir mais espaços dentro de órgãos federais para desfazer o descontentamento.

O entorno presidencial está convencido de que o aborrecimento de Alcolumbre não se deve unicamente ao fato de Pacheco ter sido preterido na escolha do STF e de Lula não ter ligado para o presidente do Senado para avisar que a indicação ocorreria em 20 de novembro, enquanto telefonou para o presidente da Corte, Edson Fachin.

O governo, porém, navega em condições difíceis dentro do processo de reaproximação. Além de não retornar às tentativas de contato de Jorge Messias, Alcolumbre também não tem conversado com o líder do Senado, Jaques Wagner (PT-BA), considerado o único nome que fala por Lula na Casa.

Parte da interlocução tem sido feita pelo líder do Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), e pelo vice-líder do governo, Otto Alencar (PSD-BA). O ponto de virada só deve ocorrer a partir de uma conversa direta entre Lula e Alcolumbre, que não tem previsão de acontecer. O timing para esse encontro deve ser definido por dois fatores: o esfriamento da crise e o diagnóstico de onde está o calcanhar de Aquiles do aborrecimento do Senado, num processo que vem sendo descrito por aliados como uma “cirurgia de muitos pontos”.

Presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Alencar (PSD-AP) admite que a escolha de Messias decepcionou Alcolumbre.

— A carta é uma resposta ao que tem saído na imprensa, que ele está impondo ao governo cargos, não é verdade, ele não pediu isso. Ele nunca solicitou nada. O que ele defendeu, como muitos, foi a possibilidade de a indicação ser do Pacheco e não deu certo. Ele realmente ficou um tanto quanto decepcionado (com o governo) — disse Alencar.

O parlamentar admite que, diante da crise instalada e da falta de mensagem presidencial, a sabatina de Messias pode acabar ficando para o ano que vem.

— Não vejo problema em ficar (a sabatina) para o ano que vem. Não é uma urgência, não é fratura exposta. O André Mendonça (ministro indicado por Jair Bolsonaro ao STF) demorou quase cinco meses para ser sabatinado.



FONTE