Aprovada hأ، 15 anos, a Lei da Ficha Limpa impediu que mais de 6,2 mil pessoas condenadas se candidatassem a cargos polأticos no Brasil. Dados apurados pela CBN com o Tribunal Superior Eleitoral mostram que, nas sete eleiأ§أµes que ocorreram de 2012 a 2024, partidos da esquerda أ direita, do centrأ£o aos mais ideolأ³gicos, todos tentaram lanأ§ar pessoas condenadas em segunda instأ¢ncia a cargos eletivos. Pela regra, condenados por crimes graves como homicأdio, corrupأ§أ£o e crimes eleitorais nأ£o podem disputar as eleiأ§أµes por oito anos, contados a partir do fim da pena imposta pela Justiأ§a. O advogado e ex-juiz Marlon Reis, um dos idealizadores do movimento que levou أ criaأ§أ£o da lei, afirma que, ao ver milhares de candidaturas barradas pela lei, muitos outros polأticos tambأ©m se afastaram das disputas. “Mas isso أ© apenas a ponta do iceberg. A imensa maioria de pessoas que sabem que sأ£o inelegأveis nأ£o tentam, entأ£o, isso nأ£o vira estatأstica. Foi isso que agarrou uma prأ،tica que era humilhante para o Brasil. E essas pessoas envolvidas com corrupأ§أ£o, elas eram descobertas, renunciavam ao mandato e أ eleiأ§أ£o seguinte, e, muitas vezes, um ou dois anos depois, jأ، estavam de volta ao mesmo Congresso Nacional. Isso nأ£o acontece mais”, diz Marlon Reis. Candidatos a vereadores sأ£o a maioria entre os barrados pela Ficha Limpa Entre 2014 e 2024, foram mais de 4,2 mil candidatos a vereador impedidos de concorrer. Tambأ©m foram barrados outros 645 postulantes ao cargo de prefeito; 267 a vice-prefeito; 107 a deputado estadual; e 74 a deputado federal. O presidente Lula tambأ©m foi barrado em 2018, na corrida pela presidأھncia. A eleiأ§أ£o de 2020 teve o maior nأ؛mero de pessoas barradas pelo TSE: foram 2.382. E, de acordo com a subprocuradora-geral da Repأ؛blica Silvana Battini, nأ£o fossem algumas mudanأ§as na interpretaأ§أ£o da norma, a Ficha Limpa poderia ter um impacto ainda maior. “Na verdade, o texto da lei nunca foi 100% claro, como nenhum texto de lei أ©. E essa interpretaأ§أ£o sobre qual tipo de rejeiأ§أ£o de contas gera inelegibilidade esteve em disputa durante muito tempo. Atأ© que se firmou o entendimento de que um prefeito sأ³ se torna inelegأvel quando essas contas sأ£o rejeitadas pela Cأ¢mara de Vereadores, pela Casa Legislativa respectiva. Entأ£o, isso foi uma posiأ§أ£o de abrandamento da lei”, afirma Silvana Battini. Deputados tentam aprovar mudanأ§as para suavizar regras e reduzir puniأ§أµes As mudanأ§as de interpretaأ§أ£o do Judiciأ،rio abriram caminho para uma rediscussأ£o da lei. O texto pode sofrer mudanأ§as a partir de projetos que tramitam no Congresso Nacional, com previsأ£o de votaأ§أ£o ainda no primeiro semestre do ano. Iniciativas de deputados como Bibo Nunes (PL-RS) e Dani Cunha (Uniأ£o Brasil-RJ) sugerem a diminuiأ§أ£o do perأodo da inelegibilidade e mudanأ§as na forma de contagem do prazo de oito anos de afastamento. “Se alguأ©m cumpriu a pena de oito anos, fica com direitos polأticos suspensos durante o perأodo de cumprimento da pena, e com mais oito anos inelegأvel. Isso dأ، 16 anos fora da polأtica. Eles (deputados) querem colocar tudo para oito anos, querem que conte os oito anos da data da decisأ£o pelo colegiado. Pode sair direto da prisأ£o para a cأ©dula eleitoral, para a urna eletrأ´nica. De fato, أ© uma pena, porque a lei nأ£o tem duas dأ©cadas ainda, a gente estأ، falando aqui de uma dأ©cada e meia, e jأ، estأ، sob um ataque muito grande do Congresso. A gente tem parlamentares que sأ£o da base do governo e que sأ£o de oposiأ§أ£o que concordam em mexer nesse parأ¢metro”, explica o advogado Mأ،rlon Reis. Jأ، a advogada Gabriela Rollemberg, uma das fundadoras da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Polأtico (Abradep), afirma que, pelo fato de a lei ter sido reinterpretada vأ،rias vezes pelo TSE e pelo STF, أ© hora de pacificar o assunto. “Para parametrizar melhor e trazer um maior equilأbrio, entendo que seria interessante mudar alguns prazos das inelegibilidades, para deixأ،-los mais razoأ،veis de acordo com a gravidade das prأ،ticas, e tambأ©m para pacificar esses temas”, defende ela. O senador Marcelo Castro (MDB-PI) أ© relator do projeto do novo Cأ³digo Eleitoral, que, entre os 900 artigos do texto, reأ؛ne as iniciativas da Cأ¢mara que querem mexer na Lei da Ficha Limpa. A ideia tambأ©m أ© mudar os prazos de inelegibilidade. “Foi julgado por um colegiado. O colegiado decretou a inelegibilidade. Ponto final. No dia em que foi decretada a inelegibilidade, comeأ§a a contar (o prazo da lei). Hoje, muitos polأticos nأ£o recorrem porque, se recorrer, أ© pior pra ele. Se recorrer, nأ£o estأ، contando o tempo, sأ³ vai contar depois que ele for julgado na terceira instأ¢ncia. Isso أ© uma distorأ§أ£o da lei. Entأ£o, nأ³s estamos corrigindo esse aspecto tambأ©m”, explica Marcelo Castro. أ€ CBN, ele negou que o Congresso esteja atacando a Ficha Limpa e disse que deputados e senadores nأ£o estأ£o discutindo o assunto para beneficiar figuras crأticas da lei, como o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). “Nأ£o se pode fazer lei pra A, pra B ou pra C. Tem que fazer a lei sabendo que aqui أ© o certo. E cada um que se enquadre”, argumenta. Castro trabalha para concluir a anأ،lise do projeto no Senado e na Cأ¢mara antes de outubro, prazo limite para que as novas regras entrem em vigor jأ، nas eleiأ§أµes de 2026.
FONTE