O governo vai chamar as plataformas digitais para uma reunião nos próximos dias para apresentar o projeto de lei de regulamentação das big techs antes do envio ao Congresso. A ideia é mostrar o texto para representantes no Brasil da Meta, dona do Facebook, Instagram e WhatsApp, do Google e do TikTok.
O encontro, que pode ocorrer ainda nesta semana, será coordenado por integrantes do Ministério da Justiça, Advocacia-Geral da União e Secretaria de Comunicação Social (Secom). Organizações da sociedade civil que acompanham o tema também serão convidadas.
A articulação do texto vem ocorrendo em várias frentes dentro do governo. O Ministério da Justiça e a AGU têm conversado com o meio jurídico, enquanto a ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, dialoga com deputados e senadores. Já a Secom ficou à frente da articulação com as plataformas. O objetivo é de que essa reunião ocorra de forma quase simultânea ao envio da iniciativa ao Congresso.
Em discussão no governo há mais de seis meses, o texto está concluído e deve ser enviado ao Congresso na próxima semana. O Palácio do Planalto decidiu aguardar o Supremo Tribunal Federal julgar, em junho, o artigo 19 do Marco Civil da Internet. Por oito votos a três, a Corte decidiu que o artigo é inconstitucional e que as redes devem ser responsabilizadas por conteúdos ilícitos publicados pelos usuários. Após a decisão do Supremo, o governo tem em mãos um projeto alinhado com o entendimento da Corte.
Com a investida do presidente Donald Trump contra o governo brasileiro, usando a regulação das redes pelo STF como uma das justificativas para sobretaxas em produtos brasileiros, e com repercussão do vídeo do influenciador Felca, que levantou discussões sobre a exposição precoce de crianças e adolescentes nas redes sociais, Lula decidiu que é o momento de o governo se posicionar sobre o tema.
Antes, porém, o governo vai esperar a votação do projeto que combate a chamada “adultização” de crianças e adolescentes. A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira o requerimento de urgência para o projeto. A medida acelera a tramitação da proposta e permite que ela seja analisada diretamente em plenário, o que deve ocorrer já na quarta-feira. Com a repercussão do vídeo de Felca, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), passou a defender publicamente a aprovação do texto, que já recebeu sinal verde do Senado.
De autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-ES), o projeto tem entre seus principais objetivos garantir que as plataformas digitais facilitem aos responsáveis o acesso a informações sobre o que os filhos fazem on-line, prevenindo a exposição a crimes como pedofilia. A relatoria da proposta na Câmara é de Jadyel Alencar. Na visão do Planalto, o texto de Alessandro Vieira é complementar ao projeto que o governo vai apresentar.
A proposta vai prever que as plataformas removam, sem necessidade de ordem judicial, publicações que atentem contra a democracia e promovam outros crimes, como terrorismo, assassinatos e aqueles que tenham como alvos crianças e adolescentes. Caberá às redes manterem uma fiscalização para que seus sistemas sejam capazes de proteger crianças e adolescentes, com medidas de prevenção obrigatórias. Se isso for descumprido, haverá punições escalonadas: advertência, multa e, em casos reiterados, suspensão de 30 dias do provedor, prorrogáveis por mais 30.
O governo, porém, tem feito acenos ao Congresso com o objetivo de facilitar a tramitação e evitar críticas da oposição, que se apresenta contra legislações que mexem na dinâmica das big techs com o discurso da “defesa da liberdade de expressão”. Todos os crimes contra a honra, como injúria, calúnia e difamação, só serão removidos de publicações nas redes sociais por ordem judicial. A proposta traz também um recuo em relação ao item que previa a “remoção a partir de notificação” de “conteúdos ilícitos que promovam a desinformação sobre políticas públicas”, incluído em uma versão anterior.
Outra base do projeto para evitar polêmica entre parlamentares é que o texto não cria nenhum crime novo, mas determina que as empresas precisam atuar sobre aquilo que já é delito na vida offline. Além da proteção de crianças e adolescentes, um dos grandes focos será a prevenção do que vem sendo chamado internamente de “epidemia de golpes e fraudes” na internet. Na compreensão do governo, as plataformas não têm feito o suficiente para evitar esse tipo de crime. O projeto também proibirá o acesso de crianças de até 12 anos às redes sociais.