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Crédito, Getty Images
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- Author, Eliano Jorge
- Role, De Salvador para a BBC News Brasil
Um dos principais palcos do tênis, Wimbledon é um cenário sonhado pelo brasileiro João Fonseca para manter sua ascensão meteórica no circuito mundial.
Após vencer o britânico Jacob Fearnley na primeira rodada da competição na tradicional grama londrina, o atleta de 18 anos enfrenta o americano Jenson Brooksby nesta quarta-feira (2/7), pela segunda rodada.
É a primeira vez que Fonseca disputa a fase principal do Grand Slam inglês. No ano passado, ainda sem pontuação suficiente para se classificar diretamente, ele foi eliminado no qualificatório.
Agora, mesmo quando não garante vaga, ele recebe convite para jogar torneios.
O mundo do tênis percebeu como o carioca nascido e criado em Ipanema gera benefícios comerciais que se traduzem, por exemplo, em mais público, cobertura midiática e novos praticantes do esporte.
Pessoas em diversos segmentos da modalidade desfiam uma lista de qualidades que justificam esse alvoroço, mas todos destacam um em especial: o talento demonstrado em quadra com resultados expressivos.
Ao mesmo tempo, tratam com extremo cuidado o adolescente em formação, com uma carreira recém-iniciada e muito ainda a se provar.
Fonseca entrou no ranqueamento da Associação dos Tenistas Profissionais (ATP) como 1356º em outubro de 2022 e terminou aquele ano como 832º.
No fim de 2024, já figurava como 145º. Seu desempenho surpreendente o levou à 54ª posição em junho de 2025.
É esperada para 14 de julho a confirmação de sua presença entre os 50 melhores.
Além do que vem produzindo em quadra, ele chama a atenção por arrastar animados e barulhentos torcedores brasileiros, que se comportam como em jogos de futebol.
Também ganha manchetes ao colecionar elogios de grandes tenistas do passado e da atualidade.
“João Fonseca realmente se tornou uma sensação mundial pelo que representa e pela real possibilidade de fazer companhia a [Jannik] Sinner e [Carlos] Alcaraz como os substitutos dos formidáveis gênios [Roger] Federer, [Rafael] Nadal e [Novak] Djokovic. Esses três são insubstituíveis e, sabendo disso, os tenistas campeões do passado jogam em cima das promessas futuras a expectativa de novas revelações”, disse Thomaz Koch, de 80 anos, lenda do tênis brasileiro, à BBC News Brasil.
Para Alexandre Farias, presidente da Confederação Brasileira de Tênis (CBT), Fonseca se tornou uma sensação global por uma combinação de fatores técnicos, simbólicos e de oportunidade.
“Trata-se de um talento fora da curva, não apenas pela idade, mas também pela maturidade com que já enfrenta adversários de alto nível no circuito”, opina Farias.
Crédito, Divulgação/CBT
Colega no time brasileiro da Copa Davis, ex-número 1 do mundo em duplas e campeão de 39 torneios da ATP, Marcelo Melo, de 41 anos, atribui esse interesse em Fonseca principalmente aos resultados e ao estilo de jogo agressivo do atleta.
Credita ainda o fenômeno à perspectiva de um futuro brilhante.
“Normalmente quando um jogador vem numa sequência assim, com todas as características que ele tem, as chances de ser um top 10, top 5 e campeão de Grand Slam são muito grandes, então todos gostam de antecipar e ver desde agora como ele joga”, conta Melo.
“[Fonseca] também tem um carisma enorme, o que aumenta as chances de ter toda essa repercussão ao redor dele”, atesta.
O americano Joe Fraga, CEO da Sports 10, que desde 2009 gere os direitos de imagem de Pelé, cita outros fatores que também contribuem para a “febre”.
“Há vários motivos pelos quais Fonseca empolga. Acredito que no tênis há mais apoio, em geral, quando jovens talentos jogam”, diz Fraga.
“Parece que a torcida se apega mais rápido a um jogador promissor e favorece mais o azarão do que em outros esportes.”
Ele aponta semelhanças entre Fonseca e Gustavo Kuerten, único tenista brasileiro a liderar o ranqueamento individual.
“Traz de volta, pelo menos para mim, a energia e a empolgação que Guga costumava trazer para as quadras. Acho que muita gente tem um ponto fraco e ama o Brasil, então vai se voltar para ele”, diz.
Crédito, Reprodução/X
Convidado para torneios
Os tenistas se classificam para as competições conforme suas posições na lista da ATP. Quem não está entre os primeiros colocados pode disputar uma etapa de qualificação ou ser convidado por ser um representante local, um talento promissor, um chamariz para torcida.
Fonseca será o primeiro brasileiro e o mais jovem tenista a participar da seleta Copa Laver, que reúne alguns dos melhores do momento.
Para a oitava edição, em setembro, em São Francisco, nos EUA, o americano Andre Agassi, um dos maiores nomes da história do tênis, o convocou para o Time Mundo, que enfrentará o Time Europa.
“[Fonseca] é o tipo de jovem talento que torna a Copa Laver tão especial”, justificou Agassi.
“É destemido, enérgico, tem um jogo incrível e adora os grandes palcos. Seu desempenho nesta temporada me mostra que ele está pronto para isso”, acrescentou ao site da ATP.
O capitão comparou o brasileiro aos dois melhores atletas do circuito mundial e disse que Fonseca chamou sua atenção quando o viu jogar há alguns meses.
“Sua capacidade de bater na bola com força de qualquer lugar da quadra, sua mobilidade e suas qualidades atléticas”, enumerou o americano.
“Ele se parece um pouco com Jannik Sinner [italiano e primeiro do ranqueamento] em termos de altura. Ele consegue jogar com tanta força sem perder o equilíbrio, algo que só víamos nos primeiros anos de Carlos Alcaraz [espanhol, número 2 do mundo e ex-líder]. Mal posso esperar para vê-lo no topo”, comentou Agassi.
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Neste ano, Fonseca foi convidado para outras duas competições na Alemanha e enaltecido pelos respectivos diretores delas.
“É uma das principais promessas do circuito da ATP. Onde quer que jogue, ele cativa os fãs”, avaliou Edwin Weindorfer, de Stuttgart.
“João encarna exatamente o que nosso torneio representa: juventude, paixão e futuro”, afirmou Ralf Weber, de Halle, mencionando o “talento excepcional”.
O ex-tenista Thomaz Koch, cuja empresa atuou no marketing esportivo e na organização de eventos durante décadas, é outro a elogiar o carisma e a boa comunicação de Fonseca.
“Fala muito bem em inglês, espanhol e logicamente em português”, aprovou.
O presidente da CBT relata boa recepção estrangeira. “Nos eventos internacionais, sua presença já provoca engajamento significativo, como vimos no ATP de Miami, onde atraiu atenção do público e da mídia, e também no confronto da Copa Davis na França, em que conquistou o respeito e a admiração dos torcedores locais”, contou Farias.
Negócios
Fonseca possui “contratos de longa duração” com quatro patrocinadores, entretanto sua equipe não fala em números.
Em 2023, ele assinou acordo com a empresa suíça de material esportivo On, que tem Federer como acionista e apenas outros dois tenistas contratados: a polonesa Iga Swiatek, ex-número 1 do mundo, e o americano Ben Shelton, 10º no ranking.
Rolex, XP Investimentos e Yonex, que produz raquetes e outros equipamentos esportivos, completam a quadra.
Crédito, Reprodução/Instagram @joaoffonseca
Em um cenário de transição geracional no tênis, João Fonseca reúne características que o tornam altamente atrativo para marcas, mídia e torneios, argumenta Alexandre Farias, que preside a CBT.
“Existe uma busca natural por novos ídolos, jovens talentos capazes de renovar o interesse do público e representar uma nova era no esporte. João surge como esse nome promissor, com carisma genuíno, desenvoltura diante das câmeras e uma conexão imediata com o público jovem”, argumenta Farias, que preside a CBT.
O dirigente, aliás, enxerga aí um ponto forte de Fonseca.
“Ele é midiático sem ser artificial. Sorri, se comunica bem, mostra emoção, vibra em quadra, elementos que geram empatia e engajamento, especialmente entre crianças e adolescentes. Em um circuito muitas vezes marcado por perfis mais reservados, essa espontaneidade o diferencia.”
Embora tenha sido convencido por seu treinador a passar menos tempo no celular, Fonseca tem na internet um trunfo.
“Outro indicador claro é o crescimento acelerado de suas redes sociais, com postagens que geram milhares de interações. Esse alcance digital retroalimenta o interesse comercial, tornando João ainda mais atrativo para marcas e patrocinadores”, avalia Farias.
O presidente da principal entidade do tênis nacional explica por que o jovem promissor se valoriza.
“Além disso, existe um fator estratégico: marcas e patrocinadores enxergam em atletas como João a oportunidade de investir cedo, quando os custos ainda são acessíveis e o potencial de retorno é altíssimo”, detalha Farias.
Com duas décadas de experiência no marketing esportivo, Joe Fraga, da Sports 10, concorda sobre a busca por jogadores ainda promissores.
“Na atual era do esporte/negócios, não me surpreende que as marcas se apeguem ao jogador mais badalado e corram algum risco para serem as primeiras a escolher a nova sensação. Há o medo de ficar de fora, então, embora Fonseca ainda não esteja no topo, haverá empresas dispostas a apostar em seu futuro”, avalia.
O americano alerta para riscos nessa área. “Embora possa ser considerado um ‘produto’, ele é humano, e espero que sua equipe de gestão o apoie e proteja, permitindo que ele se concentre em seu desenvolvimento nesta fase. O céu é o limite para ele se não tentarem monetizá-lo e permitir que ele se concentre em seu talento divino”, diz Fraga.
“Esperemos que a trajetória de João dure muito e que ele não seja, como dizemos nos EUA, um ‘flash in the pan‘ [fogo de palha, em tradução livre]”.
Quanto a essa preocupação, os responsáveis pela carreira de Fonseca têm repetido sua prioridade pelo aspecto esportivo.
“A equipe está 100% alinhada que o foco dele é na quadra e em se tornar o melhor atleta que ele possa ser”, assegura Diana Gabanyi, profissional de relações públicas que também participou da trajetória de Guga.
Estrutura privilegiada
Amigo da família, Gustavo Abreu tornou-se gestor da carreira de Fonseca ao lado dos pais do tenista: Roberta, que foi jogadora de vôlei e organizou eventos esportivos, e Christiano, empresário do mercado financeiro.
Praticantes de outras modalidades, assim como os dois irmãos do tenista, eles criaram um ambiente que estimulou os precoces talentos esportivos de Fonseca, que se exercitou em futebol, jiu-jitsu, judô, surfe, escalada, vôlei e ciclismo.
Quem acompanha seus passos, mesmo à distância, manifesta confiança na determinação do atleta, na capacidade de sua comissão técnica e no suporte da família.
Guilherme Teixeira treina o tenista desde os 12 anos. Uniram-se a ele permanentemente o preparador físico Emmanuel Jiménez e o fisioterapeuta Egídio Magalhães Júnior, uma estrutura rara para um atleta iniciante.
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“Ele realmente tem um combo muito bom, excelente, com um time e a família ao redor dele, que com certeza fará a diferença pelo lado positivo para ele”, acredita o veterano Marcelo Melo.
Thomaz Koch resume: “João é um diamante e, como tal, deve ser tratado com muito cuidado e carinho para que ele possa trilhar esse longo caminho seguro.”
Ele não esconde a empolgação ao citar por que vê em Fonseca um atleta excepcional: “Pelo que demonstrou até agora dentro e fora da quadra, pela potência dos golpes, pela criatividade na construção dos pontos, pela maturidade, pela simplicidade, enfim, por ser um tenista completo e ser tão novo.”
Koch pondera, porém, que é preciso não se precipitar, diante da estrada longa.
“Temos de ter paciência para vermos o completo desenvolvimento do João principalmente na parte física e também na parte mental para saber o que fazer nas diferentes situações difíceis e descobrir o melhor caminho”, afirma.
Influências
Alguns setores já observam efeitos de João Fonseca em negócios no Brasil.
Escolinhas de tênis relatam aumento na procura por aulas, especialmente entre crianças e adolescentes, com muitos pais citando João como fonte de inspiração para estimular os filhos, atesta o presidente da CBT, Alexandre Farias.
“Essa identificação direta com um jovem talento nacional tem sido um fator de motivação importante”, diz o dirigente.
Ele cita outros tipos de influência de Fonseca. “Tem se tornado comum ver crianças imitando seus gestos em quadra, treinadores usando seu exemplo em aulas. Até mesmo os uniformes que ele utiliza já despertam o interesse de atletas amadores, um fenômeno semelhante ao que vimos com ídolos como Nadal e Federer.”
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Dono da Paulistana Academia de Tênis, criada em 1992, Ricardo Ramos conta que já passou por fases como essa.
“A gente já começa a sentir também esse movimento”, diz. Ele notou maior procura, que já vinha num crescimento desde a pandemia.
Há uma pequena fila de espera para aulas, porém há um aumento significativo na busca por treinamento para jogar torneios nacionais e internacionais.
“Com garotos a partir de 9, 10, 11 anos. Neste segmento é onde estamos sentindo mais o fenômeno de João Fonseca”, relata Ramos.
“A gente está com uma fila de espera bem grande, tem aparecido uma garotada nova. O pai que também gosta de tênis se anima, vê esse movimento e acaba trazendo [as crianças] ao invés de levar para o futebol”, afirma.
Jairo Garbi, dono da loja Tennis Pro Shop Jairo, em São Paulo, observa “um movimento, não tão expressivo, mas não deixa de ser relevante”.
“A gente não está falando de novos jogadores ainda porque isso demora para repercutir. Por enquanto, é uma minoria. A maioria é daqueles que jogavam, pararam por alguma razão e despertaram para voltar”, afirma.
Clientes têm trocado equipamentos antigos ou ressecados. Lá, perguntam sobre Fonseca e permanecem para assistir aos jogos.
“Esse crescimento já vinha com Bia Haddad num passado recente. Ela gerou mídia e interesse novo, assim como outros tenistas”, diz Garbi, relatando que João reforça essa tendência.
Fábio Silberberg, ex-tenista que disputou o circuito da ATP e a Copa Davis na década de 1990, não esconde seu contentamento: “João é fantástico de se assistir. Ele vende. E pelo potencial que tem, todos querem ver”.
Ele é CEO da Faberg Tour Experience, agência de turismo que há duas décadas leva clientes para torneios esportivos, principalmente de tênis.
Silberberg considera que atualmente poucos tenistas motivam o público a comprar ingresso para vê-los presencialmente.
“Só Alcaraz, Sinner, Djokovic. O circuito precisa de mais jogadores que vendam ingressos”, opina, acrescentando que Fonseca, neste momento, já está neste grupo.
“Durante o evento onde ele está jogando, aumentou muito a procura. Foi assim em Miami e Roland Garros. A cada jogo que ele passava, mais gente procurava ingressos para a próxima rodada”, destaca.