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- Author, Daniel Gallas
- Role, Da BBC News Brasil em Londres
Quanto imposto os ricos realmente pagam? Ricos brasileiros pagam mais ou menos do que ricos em outros países?
A alíquota do imposto mínimo dos super-ricos cresceria de acordo com a renda, pela proposta do governo. Quem ganha em torno de R$ 50 mil, pagaria uma alíquota próxima de zero. Essa alíquota subiria gradativamente até 10% — valor cobrado de quem tem rendimentos superiores a R$ 100 mil mensais (R$ 1,2 milhão ao ano).
A proposta do governo Lula para isentar o Imposto de Renda de pessoas que ganham até R$ 5 mil por mês e elevar a tributação dos contribuintes ricos foi aprovada com facilidade na comissão especial da Câmara dos Deputados na semana passada e pode ser apreciada no plenário da Casa em agosto.
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Um estudo brasileiro de 2024 sugere que os mais ricos no Brasil — com rendimento mensal superior a R$ 37 mil — pagam cerca de 14% de impostos. Segundo o estudo, esse valor é semelhante ao que uma pessoa com rendimento mensal de R$ 6 mil paga — o que mostraria que os muito ricos estão pagando a mesma alíquota que uma pessoa de classe média.
A implicação é que a tributação no Brasil seria regressiva, ou seja, que a estrutura de cobrança de impostos do país estaria agravando as desigualdades, deixando os ricos ainda mais ricos relativo aos demais.
Nos EUA, uma investigação afirma que alguns dos americanos mais ricos pagam uma alíquota próxima a 15% — mas alguns bilionários, como Jeff Bezos e Elon Musk, teriam pago zero impostos em alguns anos, se aproveitando de brechas legais (leia mais abaixo na reportagem).
O bilionário Warren Buffett — que defende que ricos precisam pagar mais impostos — revelou que em um determinado ano pagou uma alíquota de 17% — quase metade do que pagou sua secretária.
Confira abaixo os casos em diferentes países.
Como os ricos conseguem pagar menos impostos?
É difícil saber exatamente quanto os ricos pagam de imposto porque grande parte das suas fontes de renda são taxadas com alíquotas menores.
A carga tributária que incide sobre pessoas de classe média ou mais pobres é mais fácil de ser calculada, pois suas fontes de remuneração são mais simples. Impostos são pagos sobre rendimentos (muitas vezes com o imposto de renda já descontado da fonte), impostos sobre vendas de apartamentos e veículos e impostos sobre o consumo.
Um relatório de 2023 da Oxfam — organização não-governamental britânica de combate à pobreza — detalha alguns tipos de rendimento que costumam ser taxados com alíquotas menores usados pelos ricos em todo o mundo:
- Dividendos: muitas pessoas ricas possuem suas próprias empresas e recebem a maior parte dos seus rendimentos na forma de lucros e dividendos — em vez de salários. No Brasil, lucros e dividendos recebidos por pessoa física são totalmente isentos de impostos. Já salários acima de R$ 4.664,68 precisam ser taxados em 27,5%, que é a maior alíquota de imposto.
- Ganhos de capitais: é o ganho obtido sobre a venda de um ativo que se valorizou desde que foi comprado. É o caso de vendas de ações, por exemplo. No Brasil, essas alíquotas são menores do que a do imposto de renda. Um ganho inferior a R$ 5 milhões é tributado em 15%.
- Ganhos de capital não-realizados: enquanto um bem não é vendido, o lucro não é realizado. Ainda assim, o ativo pode ter se valorizado nesse período, e essa valorização não é tributada.
- Herança: O imposto sobre herança no Brasil varia entre 2% e 8%, dependendo do Estado. Mas segundo a Oxfam em mais de 70 países não existe imposto sobre herança.
Quanto os mais ricos pagam de impostos no Brasil?
Um estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Avançadas (Ipea) de outubro do ano passado estima que cerca de 800 mil contribuintes com renda média de R$ 449 mil por ano — R$ 37,4 mil por mês — pagam no máximo 14,2% de alíquota.
Segundo o estudo do economista Sergio Gobetti, esse é o mesmo percentual usado para calcular o Imposto de Renda devido por uma pessoa assalariada que receba R$ 6 mil de vencimentos.
A alíquota de 14,2% seria a máxima paga pelos brasileiros mais ricos. Os que têm rendimento superior a R$ 449 mil pagam ainda menos.
O 1% mais rico da população — cerca de 1,5 milhão de pessoas, com renda anual de R$ 1,053 milhão ou renda mensal de R$ 87 mil — a alíquota cai para 13,6% segundo o estudo de Gobetti.
Já o topo da pirâmide — as 153 mil pessoas com renda anual de R$ 5,3 milhões ou mensal de R$ 441 mil — a alíquota média cairia para 13,2%. Para quem tem renda anual de R$ 26 milhões ou mais de R$ 2 milhões por mês, a alíquota chega a 12,9%.
Como os ricos fazem para pagar alíquotas menores de imposto no Brasil?
Muitos conseguem enquadrar seus rendimentos em categorias que são menos tributadas. Segundo o Ipea, na parcela de 0,01% dos declarantes mais ricos, 81% da renda vêm de ganhos de capital, lucro e juros ou de atividade rural.
O estudo de Gobetti afirma que a regressividade na proporção de imposto a ser recolhido pelos estratos mais ricos da sociedade brasileira “é reflexo de inúmeras distorções e privilégios perpetuados no sistema tributário brasileiro”.
Quanto imposto os americanos mais ricos pagam?
O debate sobre se impostos são progressivos ou regressivos acontece não só no Brasil, mas em quase todo o mundo.
Mas na prática regras complicadas e exceções fazem com que muitos sistemas sejam regressivos — ou seja, em que a camada mais pobre é mais onerada proporcionalmente em seu rendimento do que os ricos.
Em 2011, o investidor americano Warren Buffett — considerado o homem mais rico do mundo hoje, com fortuna estimada em US$ 160 bilhões (equivalente a R$ 870 bilhões) — fez uma crítica feroz ao sistema tributário dos Estados Unidos.
Buffett deu uma entrevista ao lado de sua secretária pessoal Debbie Bosanek na qual mostrou sua declaração de imposto de renda. Buffett pagou uma alíquota total de 17,4% — já sua secretária pagou alíquota de 35,8%.
“Todos em nosso escritório estão pagando uma alíquota de imposto mais alta que a de Warren”, disse Bosanek na entrevista.
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Já Buffett atacou o sistema tributário dos EUA. Ele disse que bilionários como ele conseguem reduzir sua alíquota de imposto baseado na distribuição de lucros e dividendos, que pagam impostos menores.
“O que aconteceu nos últimos anos é que nos disseram que a maré alta levantaria todos os barcos, mas a maré alta levantou todos os iates”, afirmou o bilionário.
O protesto do bilionário deu origem à Buffett Rule — uma proposta do então presidente Barack Obama de criar um imposto mínimo de 30% a quem tivesse rendimento superior a US$ 1 milhão por ano (R$ 5,45 milhões ou cerca de R$ 450 mil mensais).
No entanto, a proposta nunca virou lei, por sofrer enormes resistências no Congresso.
Em 2021, o site de jornalismo investigativo ProPublica publicou declarações de imposto de renda de bilionários como Warren Buffett, Jeff Bezos e Elon Musk.
O site alegou que Bezos, da Amazon, não teria pago impostos em 2007 e 2011, enquanto Musk, da Tesla, não teria pago nada em 2018.
O ProPublica disse que os 25 americanos mais ricos pagam menos impostos — uma alíquota média de 15,8% — do que a maioria dos trabalhadores dos EUA.
“Usando estratégias fiscais perfeitamente legais, muitos dos super-ricos conseguem reduzir suas contas de impostos federais a nada ou quase isso”, disse a reportagem do site.
Os dados do ProPublica levantaram um debate se o sistema tributário dos EUA é progressivo ou regressivo. A reportagem dizia que o sistema era regressivo — com americanos mais pobres sendo mais onerados que os ricos.
“O cenário é completamente diferente para os americanos de classe média, por exemplo, assalariados na faixa dos 40 anos que acumularam uma riqueza típica para pessoas da sua idade.”
Mas há quem conteste essa visão.
A Tax Foundation, um thinktank apartidário dedicado a questões tributárias internacionais, afirmou que um estudo do Tesouro americano demonstra que alguns segmentos mais ricos da população americana pagam mais impostos que os demais.
“As alíquotas efetivas de imposto geralmente aumentam com a riqueza. Os 10% mais ricos tinham uma alíquota efetiva de imposto de renda e folha de pagamento federal de 25%. Para os três grupos seguintes (o 1% mais rico, 0,1% e 0,01%), a alíquota efetiva de imposto de renda e folha de pagamento federal sobe para 30%”, afirma o estudo de novembro de 2024.
A Tax Foundation afirma que a maior parte da carga tributária que incide sobre os mais ricos vem do “corporate tax”, o imposto de renda sobre pessoas jurídicas.
Em maio deste ano, a ideia de uma taxação especial de super-ricos ganhou um improvável defensor nos EUA. O presidente Donald Trump se manifestou favorável à ideia de um imposto de até 40% em cima de ganhos superiores a US$ 2,5 milhões anuais (R$ 13 milhões por ano ou cerca de R$ 1 milhão mensais).
“Eu e todos os outros aceitaríamos de bom grado [um imposto sobre super-ricos] para ajudar os trabalhadores de baixa e média renda”, escreveu Trump.
No entanto, a proposta não foi incluída na “big, beautiful bill” — o grande pacote de mudanças fiscais do seu governo.
E no Reino Unido, quanto de impostos os ricos pagam?
No Reino Unido, um estudo de 2020 sugere que os britânicos ricos pagam alíquotas maiores do que nos EUA e Brasil.
E os ricos respondem por grande parte da receita tributária do governo.
O 1% mais rico no Reino Unido paga 30% de toda a receita do governo com o imposto de renda
“[Isso representa] uma parcela maior do que em qualquer outro momento nos últimos 20 anos. Em outras palavras, três em cada dez libras esterlinas que o governo recebe em imposto de renda são pagas por pouco mais de 300 mil indivíduos”, diz o estudo da Universidade de Warwick e da London School of Economics intitulado Quanto imposto os ricos realmente pagam?
Esse dado costuma ser usado no país como argumento contra mais taxação sobre os mais ricos. Mas, segundo os pesquisadores, esses números não mostram o quadro completo do que acontece no Reino Unido. O número médio esconde os extremos.
“A maior parte da receita do 1% mais rico vem de um grupo de funcionários com altos rendimentos, que pagam a alíquota máxima de 45% de imposto de renda mais 2% de contribuição para previdência, com deduções ou isenções mínimas”, dizem os pesquisadores Andy Summers e Arun Advani.
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“Mas uma minoria substancial paga alíquotas muito mais baixas, especialmente considerando os ganhos de capital, que oferecem uma forma alternativa de receber recompensas, principalmente para os mais ricos.”
Em 2016, os super-ricos com rendimento de 1 milhão de libras (R$ 7,4 milhões por ano ou R$ 615 mil mensais) pagaram apenas 35% de alíquota.
Mas 10% desses indíviduos super-ricos conseguiram pagar, de forma totalmente legal, menos apenas 11% em impostos — a mesma alíquota que incide sobre britânicos com renda anual de 15 mil libras (R$ 110 mil — ou R$ 9,2 mil mensais).
Consequência: aumento da desigualdade
A desigualdade segue crescendo no mundo, segundo dados do World Inequality Lab, uma entidade que reúne economistas que fazem campanha por maior taxação de super-ricos.
Os 10% mais ricos da população global atualmente detêm 52% da renda global, enquanto a metade mais pobre da população recebe 8,5%. Em média, uma pessoa entre os 10% mais ricos do mundo ganha US$ 122 mil por ano (R$ 678 mil por ano ou R$ 56 mil), enquanto alguém da metade mais pobre da distribuição de renda global ganha US$ 3.920 por ano (R$ 21 mil ou R$ 1.860 por mês).
O Brasil é um dos países com maior desiguladade de renda, segundo o relatório. No Brasil, uma pessoa entre os 10% mais ricos ganha 29 vezes mais do que uma pessoa na metade mais pobre da população.
Os economistas argumentam que um dos desafios para se melhorar os sistemas tributários e atacar o problema da desigualdade é compreender melhor as dinâmicas da riqueza x impostos. Mas acrescentam que ainda existe pouca transparência sobre esses números.
“Vivemos em um mundo repleto de dados, mas carecemos de informações básicas sobre desigualdade. Os números do crescimento econômico são publicados anualmente por governos em todo o mundo, mas eles não nos dizem como o crescimento se distribui pela população — quem ganha e quem perde com as políticas econômicas. O acesso a esses dados é fundamental para a democracia”, diz o relatório.