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Crédito, Getty Images
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- Author, Tom Bateman
- Role, Da ONU (Nova York, EUA) para a BBC News
O Canadá se uniu à França e ao Reino Unido e anunciou seus planos de reconhecimento do Estado palestino. Enquanto isso, os Estados Unidos seguem firmemente defendendo Israel.
Mas será que o presidente americano, Donald Trump, tem um plano de longo prazo para o futuro da Faixa de Gaza?
De todo o histórico recente de declarações sobre o Oriente Médio, talvez esteja menos presente na memória coletiva um pronunciamento feito em Tóquio, no Japão, durante uma reunião do G7 (o grupo dos países mais poderosos do mundo), em novembro de 2023.
O então secretário de Estado americano Antony Blinken descreveu uma série de princípios para o “dia seguinte”, após o término da guerra em Gaza.
Ele viajou para o Japão depois de visitar Tel Aviv, em Israel, onde se encontrou com os líderes do Estado judaico. A reunião ocorreu um mês após os ataques do Hamas no dia 7 de outubro daquele ano, já durante a ofensiva israelense que se seguiu.
Blinken relacionou quais eram as condições dos Estados Unidos para os objetivos militares de Israel e para o conflito como um todo:
- Não deslocar os palestinos à força;
- Israel não deve reocupar a Faixa de Gaza após o fim da guerra;
- Não tentar bloquear, nem sitiar Gaza;
- O futuro governo do território deve ser liderado pelos palestinos e envolver a Autoridade Nacional Palestina reconhecida internacionalmente;
- Não há lugar para o Hamas.
Estes princípios pretendiam atrair o apoio dos aliados dos Estados Unidos na Europa e em parte do mundo árabe, mesmo com a possível objeção de Israel a vários deles.
Poucos provavelmente se lembram de Blinken declarando seus Princípios de Tóquio — muito menos os membros do governo Trump, que os descartou imediatamente.
Mas estas ideias ainda contam com o apoio de vários aliados americanos. E eles viajaram nesta semana para as Nações Unidas, em Nova York (EUA), atendendo à convocação de uma conferência liderada pela França e pela Arábia Saudita, para reativar o debate sobre uma solução de dois Estados.
Crédito, Mohammed Saber/EPA/Shutterstock
A conferência chegou às manchetes da imprensa, depois que a França (seguida pelo Reino Unido) se comprometeu a reconhecer um Estado palestino até o final do ano, sob certas condições. E, na quarta-feira (30/7) à tarde, o Canadá anunciou a mesma decisão.
Mas o governo Trump boicotou a reunião, que considera anti-Israel.
“Os Estados Unidos não participarão deste insulto, mas continuarão a liderar esforços no mundo real para pôr fim aos combates e oferecer a paz permanente”, declarou a porta-voz do Departamento de Estado americano, Tammy Bruce. Ela ridicularizou a conferência, chamando-a de “manobra publicitária”.
Com isso, foi aberto um fosso entre os Estados Unidos e seus tradicionais aliados sobre o futuro do conflito entre israelenses e palestinos.
Isso levanta uma questão: o governo Trump tem uma visão de longo prazo sobre o futuro governo de Gaza e a paz permanente na região? Está ficando cada vez mais claro que a resposta é “não”, pelo menos dele próprio.
No início de julho, perguntei a Bruce qual seria a visão do governo sobre o futuro governo da Faixa de Gaza, além da exigência de que o Hamas não pode existir.
Ela respondeu que “os países, nossos parceiros na região” estão trabalhando para implementar “novas ideias” solicitadas pelo presidente.
Questionei novamente para saber o que isso envolveria. Bruce respondeu: “Não vou contar especificamente hoje.”
Em fevereiro, o presidente Trump declarou que os Estados Unidos assumiriam a Faixa de Gaza para construir a “Riviera do Oriente Médio“.
O plano envolvia o deslocamento forçado dos palestinos que moram no território. Posteriormente, os Estados Unidos e Israel tentaram explicar que se tratava de uma emigração “voluntária”.
Provavelmente, este plano envolveria a ocupação militar do território por Israel, para possibilitar sua execução. Não ficou claro como seriam derrotadas eventuais insurgências remanescentes do Hamas ou de outros grupos armados.
Desde então, o plano foi lenta e silenciosamente abandonado, pelo menos na sua forma completa.
Questionado na terça-feira (29/7) sobre seu plano de remover os palestinos, Trump o descreveu como “um conceito que realmente foi bem recebido por muitas pessoas, mas também houve quem não gostasse”.
Esta provavelmente foi uma referência à rejeição dos países árabes, como a Arábia Saudita e outros Estados do Golfo, visitados por Trump em maio para um suntuoso tour comercial em palácios dourados.
O governo americano prefere comentar questões imediatas, como a libertação dos reféns e um cessar-fogo na região.
Quando Trump foi novamente questionado para que olhasse além deste processo, durante uma visita recente à Casa Branca do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, ele imediatamente cedeu a palavra para que o líder israelense respondesse.
Sua atitude se soma às evidências crescentes de que a estratégia do governo Trump sobre a Faixa de Gaza é cada vez mais similar à do seu aliado israelense.
Netanyahu rejeita qualquer envolvimento da Autoridade Nacional Palestina no futuro governo de Gaza. As forças israelenses, atualmente, controlam cerca de dois terços do território.
O grupo de extrema direita da sua coalizão de governo exige a ocupação militar permanente, a expulsão dos palestinos e a construção de assentamentos judeus na Faixa de Gaza.
Israel e os Estados Unidos tentaram controlar o fornecimento de alimentos para os palestinos, dentro de zonas militarizadas. Paralelamente, Israel também fornece armas para os milicianos palestinos adversários do Hamas.
O organismo internacional que monitora a ocorrência de fome — a Classificação Integrada de Fases da Segurança Alimentar (CIF) — declarou que existem cada vez mais evidências de fome generalizada, desnutrição e doenças na Faixa de Gaza.
Israel culpa o Hamas e a ONU pela crise, mas afirma que está oferecendo mais ajuda à população local.
Muitos países europeus assistiram horrorizados.
“Observamos as cenas mais horríveis”, segundo me disse na quarta-feira (30/7) o secretário do Exterior britânico, David Lammy. “A comunidade global está profundamente indignada por ver crianças serem alvejadas e mortas enquanto procuram ajuda.”
A fome parece ser um ponto de inflexão para os países europeus — um ímpeto moral para orientar sua diplomacia divergente.
As pressões domésticas pelo reconhecimento de um Estado palestino sob certas condições também cresceram no Reino Unido e na França.
Sem um plano abrangente, com apoio internacional, para o futuro governo da Faixa de Gaza, a perspectiva é de um caos cada vez maior no território.
Crédito, Reuters/Ronen Zvulun
Blinken tinha consciência deste risco desde o início da guerra.
Por isso, ele viajou pelos países árabes, tentando conseguir a assinatura deles para um plano futuro que envolvesse parte da Autoridade Palestina e o fornecimento de forças de segurança pelos países árabes.
Ele também interveio em pelo menos três ocasiões, forçando Israel a permitir a entrada de mais ajuda em Gaza. Por duas vezes, ele ameaçou restringir o envio de armas americanas para conseguir seu objetivo.
O governo Trump não manteve esta pressão e acelerou o envio de armas para Israel desde sua posse, em janeiro.
Os Estados Unidos ficaram em uma espécie de vácuo estratégico, em relação aos planos de longo prazo para a Faixa de Gaza. E os europeus, em conjunto com os países árabes do Golfo Pérsico, passaram esta semana tentando preencher este vácuo.
Para eles, sem ajuda efetiva, governança e um plano de paz de longo prazo, o impacto no território só irá aumentar.
Nesta semana, eles clamaram por uma intervenção urgente com ajuda humanitária, declararam seu apoio à Autoridade Nacional Palestina e reiniciaram o trabalho rumo a uma solução de dois Estados, mesmo sem a participação americana.
Sua iniciativa questiona anos de convenções de que as principais potências ocidentais somente reconheceriam um Estado palestino depois de negociações entre os palestinos e Israel.
E sua declaração conjunta traz consigo um ponto importante: a Arábia Saudita, um dos líderes do mundo árabe e muçulmano, se uniu à condenação do Hamas e à convocação do seu desarmamento,.
Agora, eles esperam que suas ações, com o apoio dos países árabes, pressionem Trump novamente rumo a um processo diplomático mais estabelecido.
Sua conferência na ONU (que irá ocorrer novamente em setembro) enfrenta todos estes obstáculos. E a cadeira da superpotência está vazia.